Ipê amarelo

Hoje percebi que não é fácil caminhar pelas ruas de Brasília em pleno mês de setembro, e olhe que era pela manhã. Olhei para o relógio digital público sobre a calçada da L2 sul. Estes relógios nos fornecem a data, a hora, é lógico não é, afinal é um relógio, e também a temperatura. Achei estranho. Faltava ali uma informação importante, ao menos ao meu ver, principalmente na capital federal. Cadê a umidade? Não tinha. E semana passada a umidade estava a 12%, você sabe o que é 12% de umidade? É desértico.

Então percebi que o nosso clima não estava muito diferente de um deserto, se bem que nunca estive em um. De toda forma estava tudo seco, ou melhor, quase tudo. As árvores secas, os gramados acinzentados , uma queimada aqui, outra ali. Nesta manhã percebi o quanto é difícil respirar, o quanto a pele sofre, trincada; percebi nos meus lábios o gosto das rachaduras, e me esqueci do gosto das rapaduras. Mas mesmo assim, mesmo em meio a toda essa secura, ao lado do relógio eu vi um ipê, e quando tudo estava seco, o ipê estava ali, florido, um ipê amarelo. Agora podem falar, ou reclamar, afinal falar de ipê em Brasília é tão clichê. De fato, é clichê e tenho essa consciência, mas veja bem, existe algum clichê pior do que os candidatos falando sobre ética e moral, ou ainda se auto-intitulando como renovação? Acredito que não.

Voltando… Incrível! Como o ipê consegue florescer na seca? Entendo que meu coração deve ser um pouco ipê. Entretanto… Sabe, nos últimos tempos acho que a secura de Brasília adentrou nossas vidas. E isso é triste. Quando nos encontramos nesta seca a esperança parece não germinar, nossas expectativas de melhoras se resumem a cinzas queimadas pela verdade cruel. Quando assisto ao horário eleitoral obrigatório e me lembro das promessas dos anos passados, que não se cumpriram, diga-se de passagem, e revejo as mesmas promessas, os mesmos atores, tenho minha confirmação: o clima está seco.

Vale a pena acreditar nessas promessas? Afina, já nos decepcionamos tantos, para mim a ética e a moral dos políticos são como a vegetação deste cerrado, cerradas. Mas o ipê está florido, o ipê amarelo está vivo. Eu não entendo de cor, nem quero entender, mas amarelo, se não me engano, significa também esperança, digo “também” porque acho que significa dinheiro, mas isso é uma outra história.

Mas então quem é o ipê? Não estou aqui para fazer campanha para fulano ou beltrano, para falar a verdade eu acho que o ipê sou eu, sim, é isso mesmo, eu – quero deixar claro que não sou candidato – sou eu, é você, somos nós. A esperança não está neles, está em nós. Cada vez mais reivindicamos nossos direitos, protestamos contra abusos, fazemos valer o que a Constituição nos garante.

Ninguém dá nada para aquela árvore seca, mas quando está tudo seco e nem arruda funciona – não pude evitar o arruda, oh tragédia – aquela árvore seca pode florescer, e então, tudo fica um pouco mais bonito. Sei que não é fácil ser ipê, sei que não é fácil ser a esperança quando resta pouca esperança. Podemos ser a esperança nestas eleições, nos informar sobre os candidatos votar conscientes, pesquisar se for necessário.

Nesta democracia representativa nossa participação não se encerra no ato do voto, e aí a esperança se fortalece, vamos nos fazer representar, cobrar as promessas, enviar e-mails, acompanhar os mandatos dos eleitos, não podemos ficar parados de braços cruzados e esperar. Não foi de braços cruzados que o ficha limpa foi aprovado, não foi de braços cruzados… Não quero ver mais Brasília neste clima, ainda mais que não faz à saúde. Não quero mais ver a situação precária da educação, as pessoas mais carentes se viciando em crack para evitar a sensação a dor e a fome, não quero ver mais as filas enormes dos hospitais e os congestionamentos no principio e fim de cada dia. Não quero mais ver a UnB sucateada e em greve.

Eu sou bem realista, não acredito em muitas coisas, acredito em Deus e por isso sei que existe esperança. Nesta terra seca, na nossa humildade, acredite em você, ainda há uma gota de esperança, vamos votar, vamos escolher alguém que possa fazer algo, mesmo que seja difícil tentar, mesmo que seja difícil acreditar, e quem sabe o clima se torne um pouco mais úmido.

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