Rosas

No sábado retrasado resolvi fazer algo diferente para minha namorada, algo que representasse o meu afeto. Pensei em algo romântico, elegante.  A criatividade da mente humana é realmente uma coisa fascinante. Quando procuramos sinceramente ser originais, esbarramos no maior dos clichês. Meu destino, obvio, foi a floricultura. O caro leitor que já fez este exercício romântico sabe o quão difícil é estar em uma floricultura e escolher a flor ideal para a sua amada querida, é tão difícil frente a quantidade de opções e perfumes que acabamos por escolher a mais simples e bela, ou seja, a rosa. Nada mais genial do uma rosa vermelha. De preferência acompanhada por uma boa frase de efeito como: uma flor para outra flor, e lógico, um jantar romântico, luz de velas e etc.. Aliás, qual mulher não se atrai por uma jantar a luz de velas, principalmente for acompanhado por uma rosa vermelhar. .Entretanto existe uma reflexão profunda sobre esta escolha aparentemente simples

Depois de cinco minutos intermináveis de indecisão com todas aquelas flores, e acredito ser o máximo que um homem, ou pelo menos a grande maioria deles, consegue agüentar ao realizar uma compra, decidi-me: – vou ficar com uma rosa. Disse eu resoluto a vendedora. Em breve estava em um mar de rosas. Havia rosas de vários tamanhos, formas, e cores. Todas incrivelmente lindas, de um perfume que é realmente difícil descrever na minha sintaxe que só suporta dois adjetivos em uma única frase. O que posso dizer sobre isso… Se as aquelas rosas fossem mulheres eu estaria em um concurso de miss. Seria difícil escolher qual seria a mais bonita ou a mais perfumada, enfim eram todas perfeitas. E eis aí o maior problema, eram todas demasiadamente perfeitas.

Não sei se a leitor ou se a leitora estão atentos, mas no começo, se quiser pode voltar ao começo, não recomendo, irei repetir.  O meu propósito ao inicio de tudo era fazer algo diferente, mas uma coisa que significasse a realidade que sinto, como então representar algo verdadeiro com algo que de tão perfeito revela a mais pura artificialidade

Não sei se me compreendem, mas todas aquelas rosas perfeitas foram fruto de um longo processo de seleção monitorada, de cruzamentos e experimentos, para se chegar a um resultado compreendido por perfeito. Em algum lugar na história ficou a realidade, uma rosa original, verdadeira, com aroma de verdade e não com aquele perfume balsâmico que eu sentia na floricultura. Por incrível que parece eu pensei nisso tudo em um instante. Um instante estranho, diga-se de passagem.  Fui embora de mãos vazias, todavia perfumado. Nenhuma daquelas rosas significava ou poderia representar o que de fato existe em mim.

Pensei, e hoje posso seguramente dizer que estamos em um recorte no tempo no qual o padrão de beleza, que bem sabemos ser relativo e variável de acordo com o tempo e espaço, preza e valoriza, um tanto demasiadamente a meu ver, rosas perfeitas, rosas artificiais. De fato, a rosa é uma expressão metonímica de um conceito enraizado em nossa sociedade hodierna. Posso exemplificar, na arquitetura, nas tendências de vanguarda, na pintura. E este conceito não se restringe às artes, está presente no senso comum, na importância a valor conferido ao silicone, por exemplo, ou botox e coisas do gênero, que só de olhar eu posso dizer que é artificial.

Rejeito estes valores, o belo está no natural, e a diferenciação consiste em imperfeições, e não estou discorrendo aqui sobre moral, mas entenda no amplo sentido se quiser, estamos dialogando em um texto aberto. É justamente nossas imperfeições que tornam as coisas interessantes, principalmente quando por métodos naturais buscamos superá-las, ai sim entram como acessórios, como adorno, as artificialidades, entretanto exageramos muitas vezes, e exageramos ao ponto de nos tornarmos essencialmente artificiais, eis o problema. As relações humanas não podem ser pautadas em artificialidades, nem que sejam meramente estéticas.  Acredito que a presente produção está tornando-se densa e complicada, e como não sou dado as filosofações, para não perder-me fico por aqui.

Ah… ia me esquecendo. Irei satisfazer a necessidade de meus leitores mais curiosos. Não fiz nada diferente, mas vivemos um momento incrível, o que fizemos? Nada, ou melhor, ficamos em casa, conversamos sinceramente, olhamos um nos olhos dos outros e caminhamos pela rua… foi ai que eu encontrei uma raridade, algo que não se ver todos os dias. Seja por que as pessoas pouco se interessam, seja pela dificuldade de cultivar, ou seja, pelos espinhos. O que eu encontrei?Adivinha… isso mesmo, uma rosa. Uma rosa rosa verdadeira.  Fui até o jardim, e perdi permissão ao dono, um senhor bigodudo. Ele ficou um tanto surpreso e permitiu que eu apanhasse a flor. Ele disse que iria pegar um podão, mesmo sem saber exatamente o que era, eu recusei agradecendo, meti a mão e quebrei o galho que julguei mais belo. Havia três rosas rosas pequenas neste, das quais uma esfarelou o sei lá o quê. Arrependi-me de ter colocado as mãos diretamente, essas rosas contêm um tipo diferenciado de espinhos, são pequenos e muitos, difíceis de sair,mas muito inconvenientes.

Minha namorada sem graça observava tudo resignada, embora com um sorriso tenro e um olhar de contentamento, mal sabia ela do que realmente aquela rosa significava. Dei-lhe a rosa rosa e uma sema depois terminamos felizes .

Uma resposta para Rosas

  1. Gustavo Souza disse:

    Já leitor assíduo do Suspiro, inequívoco digo me surpreender a cada publicação com um conteúdo e forma modernos, próprios, originais e incidentes sobre o cotidiano. O Suspiro inspira e faz suspirar. Parabéns!

Deixe um comentário